07 JUL
Sábado, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA SINFÔNICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
JOHN NESCHLING regente
VADIM GLUZMAN violino
CORO DA OSESP
NAOMI MUNAKATA regente do coro
LIDUINO PITOMBEIRA
Mariinha (1ª audição mundial)
SAMUEL BARBER
Concerto para Violino, Op.14
ROBERT SCHUMANN
Sinfonia nº 2 em Dó maior, Op.61
07 JUL
Sábado 24h
Espaço Cultural Dr. Além
JOCY DE OLIVEIRA meios eletroacústicos e difusão
GABRIELA GELUDA soprano
JOCY DE OLIVEIRA
Solo - Pocket opera
8 JUL
Domingo, 12h30
Praça do Capivari
BANDA SINFÔNICA JOVEM DO ESTADO
MÔNICA GIARDINI regente
CELINA BORDALLO CHARLIER flauta
AS CHORONAS
CAMARGO GUARNIERI
Dança Brasileira
EDMUNDO VILLANI-CÔRTES
Concerto para Flauta e Banda Sinfônica
RADAMÉS GNATTALI
Suíte Retratos - para Regional e Banda Sinfônica
PAULINHO DA VIOLA
Sarau para Radamés (Arr. Júlio César Figueiredo)
TOM JOBIM
Radamés y Pelé (arr. Júlio César Figueiredo)
8 JUL
Domingo, 15h
Igreja Santa Terezinha – Abernéssia
ORQUESTRA DE CÂMARA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
GIL JARDIM regente
LUÍS EUGÊNIO AFONSO ‘MONTANHA’ clarinete
FINZI
Romance para Cordas em Mi bemol maior, Op. 11
Concerto para Clarinete e Orquestra, Op. 31
GILBERTO MENDES
Ponteio
M. CAMARGO GUARNIERI
Abertura Concertante
8 JUL
Domingo, 17h
Praça do Capivari
ORQUESTRA JOVEM DO ESTADO
JOÃO MAURÍCIO GALINDO regente
Homenagem a Chiquinha Gonzaga
Ó Abre Alas
Gaúcho
Lua Branca
Carlos Gomes
Meditação
A Dama de Ouros
Saci-Pererê
Roda Yoyô
Não insistas, rapariga!
São Paulo
Atraente
Viva o Carnaval!
9 JUL
Segunda, 21h
Auditório Claudio Santoro
Música de câmara - Artistas do Festival
10 JUL
Terça, 21h
Auditório Claudio Santoro
Música de câmara - Artistas do Festival
11 JUL
Quarta, 21h
Auditório Claudio Santoro
Música de câmara - Artistas do Festival
12 JUL
Quinta, 17h
Praça do Capivari
ENSEMBLE JOCY DE OLIVEIRA
JOCY DE OLIVEIRA meios eletroacústicos e difusão
GABRIELA GELUDA soprano
RICARDO RODRIGUES oboe e oboefone
PAULO PASSOS clarone
LUCIANO CORREA violoncelo
ALOYSIO NEVES guitarra elétrica
JOAQUIM ABREU percussão
RICARDO SIRI percussão
JOCY DE OLIVEIRA
Revenge of Medea
segmento da opera "Kseni - A estrangeira") - para soprano, violoncelo, clarone, guitarra elétrica, percussão
Raga no Amazonas (versão 2003)
para oboé e meios eletroacústicos
Striding through rooms - (2003)
para clarone solo
Palmyra - (1998)
para oboefone e meios eletroacústicos
Nherana - (2006) primeira audição no Brasil
para violoncelo, oboé, clarone, guitarra elétrica, percussão - (encomenda da Bayerischer Rundfunk - Musica Viva)
12 JUL
Quinta, 21h
Auditório Claudio Santoro
LONDON BRASS
Andy Crowley trompete, Gareth Small trompete, Martin Owen trompa, Robb Tooley trombone, Oren Marshall tuba
M PRAETORIUS
Dances of Terpishcore (arr. Paul Archibald)
D. SCARLATTI
Three Sonatas (arr. Stephen Dodgson)
M. ARNOLD
Brass Quintet Op. 73
J S BACH
Toccata e Fuga in ré menor (arr. T. Jackson)
KARL JENKINS
The Adiemus Collection (arr. Tony Small)
OREN MARSHALL
Bush Baby – Parts 1 and 2
CECILIA MCDOWALL
Tango Oscuro
I ALBENIZ
Espana (arr. Richard Bissill)
13 JUL
Sexta, 18h
Capela do Palácio
Música de câmara - Artistas do Festival
13 JUL
Sexta, 21h
Auditório Claudio Santoro
ANTÔNIO MENESES violoncelo
MARIA JOÃO PIRES piano
J S BACH
Suíte nº3 em Dó maior
SCHUBERT
Sonata Arpeggione em lá menor
BEETHOVEN
Sonata nº3 em Lá maior
14 JUL
Sábado, 12h30
Praça do Capivari
BANDA SINFÔNICA
ABEL ROCHA regente
LONDON BRASS
A.TRAVASSOS
"Não insistas, Chiquinha!"
NANCY GALBRIGHT
Elfin Thunderbolt
LAUNY GRONDAHHL
Concerto pra Trombone
CURNOW
Five concord diversions (para quinteto e Banda)
MEHMARI
Tipos humanos de Goya
L. BERNSTEIN
Slava! (Homenagem a Rostropovitch)
14 JUL
Sábado, 15h
Igreja São Benedito – Capivari
CORAL JOVEM DO ESTADO
NAOMI MUNAKATA regente
NIBALDO ARANEDA regente
ADRIANA CLIS mezzo soprano
SAID TUMA órgão
H. VILLA-LOBOS
Xangô
H. VILLA-LOBOS
Rosa Amarela
M. CAMARGO GUARNIERI
Sinhô Láu
M. CAMARGO GUARNIERI
O Rei mando me chamâ
M. CAMARGO GUARNIERI
Egbêgi
OSVALDO LACERDA
Três pontos de Caboclo
GABRIEL FAURÊ
Messe basse (coro feminino e órgão)
M. CAMARGO GUARNIERI
Sanctus da missa Diligite
H. VILLA LOBOS
Magnificat – Alleluia
14 JUL
Sábado, 16h
Capela do Palácio
SHARON ISBIN violão
ISAIAS SÁVIO
Batucada
GAUDENCIO THIAGO DE MELLO (editada por Antônio Carlos Barbosa-Lima)
Uirapurú do Amazonas
LEO BROUWER
El Decameron Negro (Escrita para Sharon Isbin)
La Huida de los Amantes por el Valle de los Ecos
La Arpa del Guerrero
ENRIQUE GRANADOS
Spanish Dance #5
FRANCISCO TÁRREGA
Recuerdos de la Alhambra
ISAAC ALBENIZ
Astúrias (transcrita por Andrés Segovia)
JOHN DUARTE
Joan Baez Suite, Opus 144 - (escrita para Sharon Isbin)
TAN DUN
Seven Desires for Guitar (2000) (Escrita para Sharon Isbin)
AGUSTIN BARRIOS MANGORÉ
Waltz Opus 8, #4
14 JUL
Sábado, 17h
Praça do Capivari
CAMERATA FEMININA DE VIOLÕES DO PROJETO GURI
MÔNICA SALMASO cantora
14 JUL
Sábado, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA SINFÔNICA BRASILEIRA
ROBERTO MINCZUK regente
DAME KIRI TE KANAWA soprano
RICHARD WAGNER
Abertura
ERICH KORNGOLD
Marietta's Lied
GUSTAVE CHARPENTIER
Depuis le jour
CAMARGO GUARNIERI
Encantamento
RICHARD STRAUSS
Morgen!
Ständchen
Zueignung
JOSEPH MARIE CANTELOUBE
Baïlèro
Lo Fiolairé
La Delaïssádo
RICHARD STRAUSS
Suíte da ópera O Cavaleiro da Rosa, Op. 59
15 JUL
Domingo, 12h30
Praça do Capivari
ORQUESTRA SINFÔNICA BRASILEIRA
ROBERTO MINCZUK regente
RICHARD WAGNER
Abertura
RICHARD STRAUSS
Suíte da ópera O Cavaleiro da Rosa, Op. 59
15 JUL
Domingo, 15h
Igreja Santa Terezinha – Abernéssia
15 JUL
Domingo, 17h
Praça do Capivari
ORQUESTRA SINFÔNICA BRASILEIRA JOVEM
16 JUL
Segunda 16, 21h
Auditório Claudio Santoro
Música de câmara - Artistas do Festival
17 JUL
Terça, 21h
Auditório Claudio Santoro
Música de câmara - Artistas do Festival
18 JUL
Quarta, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA SINFÔNICA MUNICIPAL DE CAMPINAS
KARL MARTIN regente
SÔNIA RUBINSKY piano
FANNY HENSEL
Abertura em Dó maior
CLARA SCHUMANN
Concerto para Piano em lá menor, Op.7
AMY BEACH
Sinfonia n°2 em mi menor, Op.32 - Gaélica
19 JUL
Quinta, 17h
Praça do Capivari
ORQUESTRA PAULISTA DE TATUÍ
ADRIANO MACHADO regente
19 JUL
Quinta, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA SINFÔNICA NACIONAL DO TEATRO CLAUDIO SANTORO
IRA LEVIN regente
ALISON BALSOM trompete
RICHARD WAGNER
Abertura da ópera Os Mestres Cantores de Nürnberg
HUMMEL
Concerto para Trompete e Orquestra
M. CAMARGO GUARNIERI
Três Danças
BÉLA BARTÓK
Concerto para Orquestra
20 JUL
Sexta 18h
Capela do Palácio
Música de Câmara - Artistas do Festival
20 JUL
Sexta, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA ACADÊMICA
DEBORA WALDMAN regente
ROSANA LAMOSA soprano Rita, dona da padaria
FERNANDO PORTARI tenor Beppe, seu marido
PAULO SZOT barítono Gasparo, o fazendeiro
CARLA CAMURATI direção cênica
GAETANO DONIZETTI
Rita, ópera cômica em um ato
librteto de Gustavo Vaez
21 JUL
Sábado, 12h30
Praça do Capivari
21 JUL
Sábado, 15h
Igreja São Benedito – Capivari
Recital da Classe de Canto
21 JUL
Sábado, 16h
Capela do Palácio
ALISON BALSOM trompete
RICHARD BISHOP piano
SHCHEDRIN
A la Albeniz
FRANCAIX
Sonatine
BITSCH
Quatre Variations sur un theme de Domenico ScarlattiENESCU
Legende
intervalo
TORELLI
Sonata
BELLINI/ARBAN
Variations on a theme from Norma
DE FALLA
Seven Popular Spanish Folk Songs
GERSHWIN
Two Songs - Someone to Watch over me and I got Rhythm
21 JUL
Sábado, 17h
Praça do Capivari
ORQUESTRA JOVEM TOM JOBIM
ROBERTO SION regente
FRANCIS HIME piano
21 JUL
Sábado, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA SINFÔNICA MUNICIPAL
JOSÉ MARIA FLORÊNCIO regente
JEAN-LOUIS STEUERMAN piano
JORGE ANTUNES
Abertura Olga
SERGEI RACHMANINOV
Concerto nº 1
HECTOR BERLIOZ
Sinfonia Fantástica
22 JUL
Domingo, 12h30
Praça do Capivari
ORQUESTRA ACADÊMICA
DEBORA WALDMAN regente
ROSANA LAMOSA soprano - Rita, dona da padaria
FERNANDO PORTARI tenor - Beppe, seu marido
PAULO SZOT barítono - Gasparo, o fazendeiro
CARLA CAMURATI direção cênica
GAETANO DONIZETTI
Rita, ópera cômica em um ato
libreto de Gustavo Vaez
22 JUL
Domingo, 15h
Igreja Santa Terezinha – Abernéssia
22 JUL
Domingo, 17h
Praça do Capivari
JAZZ SINFÔNICA
JOÃO MAURÍCIO GALINDO regente
23 JUL
Segunda, 21h
Auditório Claudio Santoro
Música de Câmara - Artistas do Festival
24 JUL
Terça 24, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA SINFÔNICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
CARLOS MORENO regente
ALMEIDA PRADO
Arcos Sonoros da Catedral Bruckner
GUARNIERI
Brasilianas
Intervalo
JEAN SIBELIUS
Sinfonia nº 2 em Ré Maior Op. 43
25 JUL
Quarta, 21h
Auditório Claudio Santoro
CRISTINA ORTIZ piano
Homenagem a Guiomar Novaes
FRANZ SCHUBERT
Sonata em lá menor, Op. 143
Impromptu em Sol bemo maior, Op.90
Impromptu em Mi bemol maior, Op.90
CLAUDE DEBUSSY
Reflets dans l'eau
L'Isle joyeuse
Intervalo
JOHANNES BRAHMS
Intermezzo em si bemol menor
Intermezzo em mi bemol menor
FRÉDERIC CHOPIN
Estudo nº 1 Op.25
Estudo nº 5 Op.25
Estudo nº 7 Op.25
Estudo nº 12 Op.25
26 JUL
Quinta, 17h
Praça do Capivari
FORTUNA
26 JUL
Quinta, 21h
Auditório Claudio Santoro
EROICA TRIO
SUSIE PARK violino
SARA SANT’AMBROGIO violoncelo
ERIKA NICKRENZ piano
REBECCA CLARKE
Trio for violin, cello and piano
ASTOR PIAZZOLLA
Três Tangos
HEITOR VILLA-LOBOS
Ária das Bachianas Brasileiras nº 5
ROBERT SCHUMANN
Trio para Piano nº 2 em Fá Maior, Op. 80
27 JUL
Sexta, 18h
Capela do Palácio
Música de Câmara - Artistas do Festival
27 JUL
Sexta, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA ACADÊMICA
ROBERTO MINCZUK regente
GABRIELA GELUDA soprano
AARON COPLAND
Fanfarra para o Homem Comum
JOCY DE OLIVEIRA
Who Cares if She Cries II?
R STRAUSS
Don Juan
JOAN TOWER
Fanfarra para a Mulher Incomum
RIMSKY-KORSAKOV
Sheherazade, Op. 35
28 JUL
Sábado, 12h30
Praça do Capivari
ORQUESTRA ACADÊMICA
ALUNOS DA CLASSE DE REGÊNCIA
R STRAUSS
Don Juan
RIMSKY-KORSAKOV
Sheherazade, Op. 35
28 JUL
Sábado, 15h
Igreja São Benedito
Recital dos Alunos da Classe de Piano
28 JUL
Sábado, 16h
Capela do Palácio
28 JUL
Sábado, 17h
Praça do Capivari
ORQUESTRA SINFÔNICA DE SANTO ANDRÉ
FLÁVIO FLORENCE regente
ROSANA LAMOSA soprano
Homenagem a Bidú Sayão
ANTONIO CARLOS GOMES
Abertura da ópera "Fosca"
HEITOR VILLA-LOBOS
"O Trenzinho do Caipira" da Bachiana Brasileira No. 2
"Canção do Amor" e "Melodia Sentimental" de "A Floresta do Amazonas"
CAMARGO GUARNIERI
"Dança Brasileira"
GEORGES BIZET
"Prélude" e "Danse Bohémienne" da ópera "La jolie fille de Perth"
GIACOMO PUCCINI
"Quando m'en vo" (valsa de Musetta) da ópera "La Bohème"
28 JUL
Sábado, 21h
Auditório Claudio Santoro
ORQUESTRA SINFÔNICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
JOHN NESCHLING regente
ANNA KORONDI soprano
CORO DA OSESP
WOLFGANG AMADEUS MOZART
Exultate jubilate, KV 165
HEITOR VILLA-LOBOS
A Floresta do Amazonas
JUL 29
Domingo, 17h
Sala São Paulo
ORQUESTRA ACADÊMICA
ROBERTO MINCZUK regente
GABRIELA GELUDA soprano
AARON COPLAND
Fanfarra para o Homem Comum
JOCY DE OLIVEIRA
Who Cares if She Cries II?
RICHARD STRAUSS
Don Juan
JOAN TOWER
Fanfarra para a Mulher Incomum
RIMSKY-KORSAKOV
Sheherazade, Op. 35
terça-feira, 22 de maio de 2007
sexta-feira, 11 de maio de 2007
lady macbeth do distrito de mtsenk - crítica de lauro machado coelho
Sufocada pelo tédio espesso da vida na província; devorada por uma paixão que a leva a todos os extremos; humilhada pela prisão, o degredo e, sobretudo, pela traição do homem que ama – cada uma das etapas da evolução psicológica de Katerína Izmáilova foi recriada, de forma impressionante, por Eliane Coelho, no palco do Teatro Amazonas. Num espetáculo que o maestro Luiz Fernando Malheiro dedicou a Mstisláv Rostropóvitch, seu incansável defensor, A Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk, a ópera de Dmitri Shostakóvitch que é um divisor de águas na história da música soviética, subiu à cena, domingo, em Manaus, pela primeira vez no Brasil.
Às inflexões de uma voz muito flexível, que sabe adaptar-se instintivamente à natureza íntima dos papéis que interpreta, Eliane somou seu talento natural para a cena. Katerína é uma personagem talhada na medida para a atriz que ela é. Da ária do primeiro ato, em que a mulher frustrada lamenta a sua solidão, ao lancinante monólogo do último ato, em que ela compara a sua alma às águas negras de um lago escondido no fundo da floresta, Eliane ofereceu, da mulher forte retratada por Lieskóv s Shostakóvitch, um retrato coerente e cheio de vibração humana.
Nisso foi apoiada, todo o tempo, pela regência de Malheiro que, da Amazônia Filarmônica, obteve uma execução limpa e precisa. Nas mãos de Malheiro, a orquestra teve grandes momentos. O interlúdio que prepara a cena de amor do segundo ato, por exemplo e, em especial, a seqüência em que Shostakóvitch faz deliberada referência ao Adagietto da Quinta Sinfonia de Mahler; ou o magnífico interlúdio que precede a cena da delegacia, no terceiro ato – para só citar alguns trechos.
A Katerína de Eliane foi muito convenientemente ladeada por Martin Mühle (Serguêi, o amante) – cuja voz desenvolveu-se num lírico spinto muito expressivo; e Marcos Paulo (Zinóvyi Borísovitch), que criou bastante bem o marido, fraco, indiferente, dominado pelo pai. Muito decepcionante, ao contrário, foi o Borís Izmáilov do russo Oliég Miélnikov. O timbre não é intrinsecamente mau; mas o cantor parece já estar em declínio: sua voz se esgarça em determinadas passagens e ele não consegue sustentar bem as notas em certas posições. Ao contrário de seus companheiros de elenco, além disso, Miélnikov é um ator de recursos muito limitados.
Essa má escolha, porém, não invalidou o equilíbrio de um elenco muito entrosado nos papéis menores: Luciana Bueno (Aksínia) e Eliane Martorano (Soniétka); Steven Bronk (o pope, uma saborosa vinheta cômica), Sérgio Weintraub (o bêbado que descobre acidentalmente o cadáver de Zinóvyi); Eric Herrero (o professor “niilista”, na delegacia) ou Leonardo Neiva, excelente caracterização do Chefe da Polícia, que protesta contra os salários pequenos e as propinas insignificantes. O registro de Luka Debevec-Meyer não corresponde ao baixo profundo requerido pela partitura para o Velho Condenado; mas seu timbre é muito bonito, e ele conferiu muita dignidade ao personagem, que é um porta-voz do compositor no monólogo do último ato, em que ecoa a imagem da URSS convertida em um gigantesco campo de concentração pela tirania stalinista. Cabe assinalar também o desempenho muito satisfatório do coro, ao longo de todo o espetáculo.
Pretensões simbólicas não muito claras – ou às vezes óbvias – tornaram dispensáveis os penduricalhos que descem do teto – uma sinistra borboleta; um cavalo destripado; a letra cirílica que, na antiga ortografia, era usado no fim de palavras terminadas por consoante – ou certas projeções, como o cavalo em disparada no final (uma imagem da liberdade só adquirida na morte?). De um modo geral, a montagem de Caetano Vilela cresceu gradualmente, ato a ato.
O primeiro ato foi prejudicado pela iluminação errática e a tendência ao modismo, comum em encenações contemporâneas, de ambientar certas cenas num breu quase absoluto, cansativo e dramaticamente ineficientes (a cena do assédio a Aksínia é o caso típico). Isso se estabilizou a partir do segundo ato; e houve, no terceiro, momentos muito satisfatórios: a cena da delegacia, em que se ressaltou a ironia com que o libreto descreve a corrupção e o autoritarismo das autoridades; e a do casamento, colorida, muito valorizada pelos bonitos figurinos de Chris Aizner e Olinto Malaquias. De grande impacto foi também o último ato, em que se viram bem resolvidas as sugestões da planície siberiana deserta, e do acampamento de prisioneiros à beira do Volga, em que Katerína se atira com Soniétka, a forçada jovem pela qual Serguêi a trocou.
Uma vez mais o Festival do Teatro Amazonas contribuiu para a história da produção de ópera no Brasil ao nos fazer ver, pela primeira vez, um dos títulos mais fortes do repertório do século 20. A interpretação de Eliane Coelho, a concepção musical de Luiz Fernando Malheiro juntaram-se para fazer dessa Lady Macbeth um espetáculo marcante.
Às inflexões de uma voz muito flexível, que sabe adaptar-se instintivamente à natureza íntima dos papéis que interpreta, Eliane somou seu talento natural para a cena. Katerína é uma personagem talhada na medida para a atriz que ela é. Da ária do primeiro ato, em que a mulher frustrada lamenta a sua solidão, ao lancinante monólogo do último ato, em que ela compara a sua alma às águas negras de um lago escondido no fundo da floresta, Eliane ofereceu, da mulher forte retratada por Lieskóv s Shostakóvitch, um retrato coerente e cheio de vibração humana.
Nisso foi apoiada, todo o tempo, pela regência de Malheiro que, da Amazônia Filarmônica, obteve uma execução limpa e precisa. Nas mãos de Malheiro, a orquestra teve grandes momentos. O interlúdio que prepara a cena de amor do segundo ato, por exemplo e, em especial, a seqüência em que Shostakóvitch faz deliberada referência ao Adagietto da Quinta Sinfonia de Mahler; ou o magnífico interlúdio que precede a cena da delegacia, no terceiro ato – para só citar alguns trechos.
A Katerína de Eliane foi muito convenientemente ladeada por Martin Mühle (Serguêi, o amante) – cuja voz desenvolveu-se num lírico spinto muito expressivo; e Marcos Paulo (Zinóvyi Borísovitch), que criou bastante bem o marido, fraco, indiferente, dominado pelo pai. Muito decepcionante, ao contrário, foi o Borís Izmáilov do russo Oliég Miélnikov. O timbre não é intrinsecamente mau; mas o cantor parece já estar em declínio: sua voz se esgarça em determinadas passagens e ele não consegue sustentar bem as notas em certas posições. Ao contrário de seus companheiros de elenco, além disso, Miélnikov é um ator de recursos muito limitados.
Essa má escolha, porém, não invalidou o equilíbrio de um elenco muito entrosado nos papéis menores: Luciana Bueno (Aksínia) e Eliane Martorano (Soniétka); Steven Bronk (o pope, uma saborosa vinheta cômica), Sérgio Weintraub (o bêbado que descobre acidentalmente o cadáver de Zinóvyi); Eric Herrero (o professor “niilista”, na delegacia) ou Leonardo Neiva, excelente caracterização do Chefe da Polícia, que protesta contra os salários pequenos e as propinas insignificantes. O registro de Luka Debevec-Meyer não corresponde ao baixo profundo requerido pela partitura para o Velho Condenado; mas seu timbre é muito bonito, e ele conferiu muita dignidade ao personagem, que é um porta-voz do compositor no monólogo do último ato, em que ecoa a imagem da URSS convertida em um gigantesco campo de concentração pela tirania stalinista. Cabe assinalar também o desempenho muito satisfatório do coro, ao longo de todo o espetáculo.
Pretensões simbólicas não muito claras – ou às vezes óbvias – tornaram dispensáveis os penduricalhos que descem do teto – uma sinistra borboleta; um cavalo destripado; a letra cirílica que, na antiga ortografia, era usado no fim de palavras terminadas por consoante – ou certas projeções, como o cavalo em disparada no final (uma imagem da liberdade só adquirida na morte?). De um modo geral, a montagem de Caetano Vilela cresceu gradualmente, ato a ato.
O primeiro ato foi prejudicado pela iluminação errática e a tendência ao modismo, comum em encenações contemporâneas, de ambientar certas cenas num breu quase absoluto, cansativo e dramaticamente ineficientes (a cena do assédio a Aksínia é o caso típico). Isso se estabilizou a partir do segundo ato; e houve, no terceiro, momentos muito satisfatórios: a cena da delegacia, em que se ressaltou a ironia com que o libreto descreve a corrupção e o autoritarismo das autoridades; e a do casamento, colorida, muito valorizada pelos bonitos figurinos de Chris Aizner e Olinto Malaquias. De grande impacto foi também o último ato, em que se viram bem resolvidas as sugestões da planície siberiana deserta, e do acampamento de prisioneiros à beira do Volga, em que Katerína se atira com Soniétka, a forçada jovem pela qual Serguêi a trocou.
Uma vez mais o Festival do Teatro Amazonas contribuiu para a história da produção de ópera no Brasil ao nos fazer ver, pela primeira vez, um dos títulos mais fortes do repertório do século 20. A interpretação de Eliane Coelho, a concepção musical de Luiz Fernando Malheiro juntaram-se para fazer dessa Lady Macbeth um espetáculo marcante.
sexta-feira, 4 de maio de 2007
o século de rostropóvitch, por lauro machado coelho
A vida inteira, ele esteve do lado certo da cerca. No dia de 1968 em que os tanques do Pacto de Varsóvia entraram em Praga, para sufocar a rebelião de Dubcek, Rostropóvitch protestou executando, no Albert Hall de Londres, o Concerto para Violoncelo de Dvorák – pilar de seu repertório, de que fez várias gravações, desde a histórica primeira vez, em 1950, com o grande maestro tcheco Václav Talich.
Percorrer a vida de Mstisláv Rostropóvitch é, de certa forma, assistir ao filme da história musical e política da segunda metade do século 20. Ele esteve presente em todos os grandes acontecimentos da vida de seu país, em uma fase muito delicada de sua trajetória. E no pé das nove páginas da edição especial que a revista inglesa Gramophone dedicou a seu 80º aniversário – comemorado um mês antes de sua morte, no último dia 27 – há, como uma linha do tempo, algumas das 240 obras que lhe foram dedicadas, e que ele estreou.
A lista é impressionante. Só ela bastaria para celebrizar um instrumentista que, a essas contribuições para o repertório, somou ainda algumas das mais belas interpretações da literatura básica para o seu instrumento. Com poucas exceções – Bartók é a maior dela – todos os grandes nomes da música contemporânea compuseram para Mstisláv Rostropóvitch, desde a Sinfonia Concertante, de Prokófiev, em 1952, até a Parábola Concertante, de Rodiôn Shtchedrín, em 2002. O bem-amado Shostakóvitch, seu amigo Benjamin Britten, Arám Khatchaturián, Henri Dutilleux, Witold Lutoslawski, Álfred Shnittke, Krzysztof Penderecki, Olivier Messiaen – as mais variadas tendências do desenvolvimento da música de hoje foram por ele defendidas.
E, no entanto, Mstisláv Leopóldovitch quase não veio ao mundo. Ao descobrir que estava grávida, a pianista Sófia decidiu abortar, pois já tinha uma filha pequena, Veroníka, e um novo bebê seria um impecilho para a sua carreira de concertista ao lado do marido, o violoncelista Leopóld Rostropóvitch que, na época, morava em Baku, no Azerbaijão. Por sorte, o tempo já decorrido desde a gravidez impediu a interrupção; e o menino que nasceu em 27 de março de 1927 cedo demonstrou ter herdado o talento dos pais para a música.
Aos quatro anos, já morando em Moscou, ele recebeu de Sófia as primeiras lições de piano. E a partir dos oito, começou o violoncelo com Leopóld, que assentou as bases de sua técnica extraordinária. Em 1940, aos 13 anos, Slava – “glória”, seu apelido premonitório – apresentou-se em público, tocando o Concerto em lá menor de Saint-Saëns. As primeiras aulas de composição, ele as teve com Mikhaíl Tchuláki; e prosseguiu-as com Vissariôn Shebalín, ao entrar para o Conservatório em 1943, um ano após a morte do pai. Ali, foi aluno de violoncelo de seu tio, o famoso Simiôn Kozolúpov (ele era casado com Nadiêjda, a irmã mais velha de Sófia). E teve aulas de composição com Shostakóvitch, seu grande ídolo e amigo, até este cair nas malhas do regime e ser demitido de seu cargo de professor (por “incompetência”!)
Um sucesso atrás do outro marcou a carreira de Mstisláv Rostropóvitch. A graduação aos 19 anos, um ano depois do primeiro lugar no Prêmio Tchaikóvski; a amizade com Prokófiev, Shostakóvitch, Miaskóvski – e com Môishei Váinberg, polonês naturalizado russo, de cuja família foi um dos poucos a não se afastar, quando ele foi vítima dos expurgos stalinistas. E essa carreira ganhou impulso novo a partir do casamento, em 1955, com uma das maiores estrelas do Bolshói: a soprano Galina Vishniévskaia, que ele conhecera em Praga. Acompanhada pelo marido, Galina, em seus recitais, deixou documentadas preciosidades do acervo russo de canção – Glinka, Tchaikóvski, Rachmáninov. juntos, eles estrearam também ciclos que Shostakóvitch escreveu para ela.
Os 52 anos da união de Galina e Slava foram cimentados não só pela arte que eles tinham em comum. Mas também, e principalmente, pela cumplicidade de quem teve a coragem de nunca se calar, nos piores momentos da história de seu país, e de quem compartilhou o sofrimento, em conseqüência dessas atitudes de destemor. Eles foram praticamente os únicos a estender a mão a Aleksandr Soljenýtsin, hospedando-o em sua datcha (casa de campo), quando ele foi expulso da União dos Escritores por ter publicado, no exterior, o Arquipélago Gulag, em que denunciava o universo concentracionário soviético, e que lhe valeu o Prêmio Nobel em 1970.
E Rostropóvitch foi o autor de uma famosa carta-aberta ao Pravda – ignorada por esse jornal, mas publicada pelo New York Times de 16 de novembro de 1970 –, em que defendia Soljenýtsin, e protestava contra outros abusos, entre eles a proibição da poesia de Iósif Bródski, dos filmes de Andrêi Tarkóvski, e da ópera A Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk, de Shostakóvitch (a gravação da versão original dessa ópera, que o Brasil, por coincidência, está ouvindo pela primeira vez, hoje, em Manaus, foi feita por ele e Galina, no Ocidente, em 1979, para o selo EMI).
Foi pesado o preço que ambos tiveram de pagar. Concertos de Rostropóvitch em Moscou ou Leningrado eram subitamente cancelados ou transferidos para Alma-Atá, do outro lado do mundo. Galina chegava ao Bolshói para cantar a Tatiana do Ievguiêni Oniéguin, seu maior papel, e descobria que seu nome não estava no programa. Em 1973, eles tinham um contrato com o selo Melódyia para gravar a Tosca. Logo depois de iniciadas as sessões de estúdio, um mensageiro da ministra da Cultura, Iekaterína Fúrtseva, chegou com a notícia de que a gravação tinha sido cancelada. Dias depois, eles souberam que o registro estava sendo feito por Tamára Mláshkina, com a regência de Mark Érmler (essa ópera também, Slava e Galina gravaram em 1979, para a EMI, com Franco Bonisolli e Matteo Manuguerra).
Nessa Tosca russa cantam Iúri Mazurôk (Scarpia) e Vladímir Atlántov (Cavaradossi). Em 1969, o casal os tinha levado para a triunfal apresentação do Ievguiêni Oniéguin em Paris, que resultou numa magnífica gravação para o selo Angel. Mas fidelidade não era moeda muito corrente num país em que a regra era virar as costas àqueles que caíssem em desgraça. Finalmente, na primavera de 1974, quando o ar se tornara irrespirável, Slava, Galina e as duas filhas receberam a autorização de sair da URSS. Estavam em Paris quando lhes chegou a notícia de que a sua cidadania soviética tinha sido cassada.
Por algum tempo, viveram como apátridas, viajando com um passaporte especial da Casa Grimaldi, de Mônaco – foi assim que vieram pela primeira vez ao Brasil, em 1978. Depois, naturalizaram-se suíços. E só em 1990 puderam voltar à Rússia e reassumir a cidadania perdida 15 anos antes. No Ocidente, Rostropóvitch continuou incansável, gravando, regendo a Sinfônica de Washington de 1977 a 1994, e encomendando obras novas a Luciano Berio, a Leonard Bernstein, a Andrzej Panufnik, a James McMillan. E, em casa, a partir do momento em que lhe foi permitido retornar, colaborou ativamente com o processo de reestruturação de seu país, após o colapso da URSS.
A Fundação Rostropóvitch-Vishniévskaia investiu somas consideráveis no apoio a crianças carentes. Uma de suas iniciativas foi um gesto de carinho e de gratidão: em maio de 2002, Slava comprou em São Petersburgo, para ali instalar um museu, o apartamento nº 7, da Marat Úlitsa. Foi ali que seu amigo Shostakóvitch morou entre 1917 e 1936.
Em 7 de abril deste ano, circulou pela primeira vez a notícia de que Mstisláv Rostropóvitch estava seriamente doente. Estivera internado em um hospital parisiense, e a medicina ocidental lhe poderia oferecer os mais modernos recursos. Mas foi para Moscou – e nessa escolha foi russo até o fim – que quis voltar. Morreu na rússkaia ziemliá, a terra russa da qual, mesmo expulso, nunca arrancou as suas raízes. E nela repousa, no cemitério de Novodiévitchi, o mesmo onde descansam Prokófiev e Shostakóvitch.
Discografia sugerida:
- Dvorák – Concerto para violoncelo (Giulini) .
● Shostakóvitch – Concerto nº 1 – Philadelphia/Ormandy (Sony)
● Brahms – Sonatas para Violoncelo – com Rudolf Serkin (DG)
● Beethoven – Sonatas para Violoncelo – com Sviatosláv Richter (EMI)
● Henri Dutilleux e Witold Lutoslawski – Concertos para Violoncelo – duas grandes encomendas contemporâneas (EMI)
● Bach – as Suítes para Violoncelo solo (EMI)
● Shostakóvitch – Sinfonia nº 4 – parte da integral com a Sinfônica de Washington (Teldec).
● Tchaikóvski – Ievguiêni Oniéguin – com Vishniévskaia, Atlántov, Mazurôk (EMI)
● Shostakóvitch – Lady Macbeth de Mtsensk – com Vishniévskaia, Gedda (EMI).
● o álbum da EMI Classics com ciclos de canções – Tchaikóvski, Mússorgski, Rachmáninov, Shostakóvitch – que ele gravou com Vishniévskaia.
Percorrer a vida de Mstisláv Rostropóvitch é, de certa forma, assistir ao filme da história musical e política da segunda metade do século 20. Ele esteve presente em todos os grandes acontecimentos da vida de seu país, em uma fase muito delicada de sua trajetória. E no pé das nove páginas da edição especial que a revista inglesa Gramophone dedicou a seu 80º aniversário – comemorado um mês antes de sua morte, no último dia 27 – há, como uma linha do tempo, algumas das 240 obras que lhe foram dedicadas, e que ele estreou.
A lista é impressionante. Só ela bastaria para celebrizar um instrumentista que, a essas contribuições para o repertório, somou ainda algumas das mais belas interpretações da literatura básica para o seu instrumento. Com poucas exceções – Bartók é a maior dela – todos os grandes nomes da música contemporânea compuseram para Mstisláv Rostropóvitch, desde a Sinfonia Concertante, de Prokófiev, em 1952, até a Parábola Concertante, de Rodiôn Shtchedrín, em 2002. O bem-amado Shostakóvitch, seu amigo Benjamin Britten, Arám Khatchaturián, Henri Dutilleux, Witold Lutoslawski, Álfred Shnittke, Krzysztof Penderecki, Olivier Messiaen – as mais variadas tendências do desenvolvimento da música de hoje foram por ele defendidas.
E, no entanto, Mstisláv Leopóldovitch quase não veio ao mundo. Ao descobrir que estava grávida, a pianista Sófia decidiu abortar, pois já tinha uma filha pequena, Veroníka, e um novo bebê seria um impecilho para a sua carreira de concertista ao lado do marido, o violoncelista Leopóld Rostropóvitch que, na época, morava em Baku, no Azerbaijão. Por sorte, o tempo já decorrido desde a gravidez impediu a interrupção; e o menino que nasceu em 27 de março de 1927 cedo demonstrou ter herdado o talento dos pais para a música.
Aos quatro anos, já morando em Moscou, ele recebeu de Sófia as primeiras lições de piano. E a partir dos oito, começou o violoncelo com Leopóld, que assentou as bases de sua técnica extraordinária. Em 1940, aos 13 anos, Slava – “glória”, seu apelido premonitório – apresentou-se em público, tocando o Concerto em lá menor de Saint-Saëns. As primeiras aulas de composição, ele as teve com Mikhaíl Tchuláki; e prosseguiu-as com Vissariôn Shebalín, ao entrar para o Conservatório em 1943, um ano após a morte do pai. Ali, foi aluno de violoncelo de seu tio, o famoso Simiôn Kozolúpov (ele era casado com Nadiêjda, a irmã mais velha de Sófia). E teve aulas de composição com Shostakóvitch, seu grande ídolo e amigo, até este cair nas malhas do regime e ser demitido de seu cargo de professor (por “incompetência”!)
Um sucesso atrás do outro marcou a carreira de Mstisláv Rostropóvitch. A graduação aos 19 anos, um ano depois do primeiro lugar no Prêmio Tchaikóvski; a amizade com Prokófiev, Shostakóvitch, Miaskóvski – e com Môishei Váinberg, polonês naturalizado russo, de cuja família foi um dos poucos a não se afastar, quando ele foi vítima dos expurgos stalinistas. E essa carreira ganhou impulso novo a partir do casamento, em 1955, com uma das maiores estrelas do Bolshói: a soprano Galina Vishniévskaia, que ele conhecera em Praga. Acompanhada pelo marido, Galina, em seus recitais, deixou documentadas preciosidades do acervo russo de canção – Glinka, Tchaikóvski, Rachmáninov. juntos, eles estrearam também ciclos que Shostakóvitch escreveu para ela.
Os 52 anos da união de Galina e Slava foram cimentados não só pela arte que eles tinham em comum. Mas também, e principalmente, pela cumplicidade de quem teve a coragem de nunca se calar, nos piores momentos da história de seu país, e de quem compartilhou o sofrimento, em conseqüência dessas atitudes de destemor. Eles foram praticamente os únicos a estender a mão a Aleksandr Soljenýtsin, hospedando-o em sua datcha (casa de campo), quando ele foi expulso da União dos Escritores por ter publicado, no exterior, o Arquipélago Gulag, em que denunciava o universo concentracionário soviético, e que lhe valeu o Prêmio Nobel em 1970.
E Rostropóvitch foi o autor de uma famosa carta-aberta ao Pravda – ignorada por esse jornal, mas publicada pelo New York Times de 16 de novembro de 1970 –, em que defendia Soljenýtsin, e protestava contra outros abusos, entre eles a proibição da poesia de Iósif Bródski, dos filmes de Andrêi Tarkóvski, e da ópera A Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk, de Shostakóvitch (a gravação da versão original dessa ópera, que o Brasil, por coincidência, está ouvindo pela primeira vez, hoje, em Manaus, foi feita por ele e Galina, no Ocidente, em 1979, para o selo EMI).
Foi pesado o preço que ambos tiveram de pagar. Concertos de Rostropóvitch em Moscou ou Leningrado eram subitamente cancelados ou transferidos para Alma-Atá, do outro lado do mundo. Galina chegava ao Bolshói para cantar a Tatiana do Ievguiêni Oniéguin, seu maior papel, e descobria que seu nome não estava no programa. Em 1973, eles tinham um contrato com o selo Melódyia para gravar a Tosca. Logo depois de iniciadas as sessões de estúdio, um mensageiro da ministra da Cultura, Iekaterína Fúrtseva, chegou com a notícia de que a gravação tinha sido cancelada. Dias depois, eles souberam que o registro estava sendo feito por Tamára Mláshkina, com a regência de Mark Érmler (essa ópera também, Slava e Galina gravaram em 1979, para a EMI, com Franco Bonisolli e Matteo Manuguerra).
Nessa Tosca russa cantam Iúri Mazurôk (Scarpia) e Vladímir Atlántov (Cavaradossi). Em 1969, o casal os tinha levado para a triunfal apresentação do Ievguiêni Oniéguin em Paris, que resultou numa magnífica gravação para o selo Angel. Mas fidelidade não era moeda muito corrente num país em que a regra era virar as costas àqueles que caíssem em desgraça. Finalmente, na primavera de 1974, quando o ar se tornara irrespirável, Slava, Galina e as duas filhas receberam a autorização de sair da URSS. Estavam em Paris quando lhes chegou a notícia de que a sua cidadania soviética tinha sido cassada.
Por algum tempo, viveram como apátridas, viajando com um passaporte especial da Casa Grimaldi, de Mônaco – foi assim que vieram pela primeira vez ao Brasil, em 1978. Depois, naturalizaram-se suíços. E só em 1990 puderam voltar à Rússia e reassumir a cidadania perdida 15 anos antes. No Ocidente, Rostropóvitch continuou incansável, gravando, regendo a Sinfônica de Washington de 1977 a 1994, e encomendando obras novas a Luciano Berio, a Leonard Bernstein, a Andrzej Panufnik, a James McMillan. E, em casa, a partir do momento em que lhe foi permitido retornar, colaborou ativamente com o processo de reestruturação de seu país, após o colapso da URSS.
A Fundação Rostropóvitch-Vishniévskaia investiu somas consideráveis no apoio a crianças carentes. Uma de suas iniciativas foi um gesto de carinho e de gratidão: em maio de 2002, Slava comprou em São Petersburgo, para ali instalar um museu, o apartamento nº 7, da Marat Úlitsa. Foi ali que seu amigo Shostakóvitch morou entre 1917 e 1936.
Em 7 de abril deste ano, circulou pela primeira vez a notícia de que Mstisláv Rostropóvitch estava seriamente doente. Estivera internado em um hospital parisiense, e a medicina ocidental lhe poderia oferecer os mais modernos recursos. Mas foi para Moscou – e nessa escolha foi russo até o fim – que quis voltar. Morreu na rússkaia ziemliá, a terra russa da qual, mesmo expulso, nunca arrancou as suas raízes. E nela repousa, no cemitério de Novodiévitchi, o mesmo onde descansam Prokófiev e Shostakóvitch.
Discografia sugerida:
- Dvorák – Concerto para violoncelo (Giulini) .
● Shostakóvitch – Concerto nº 1 – Philadelphia/Ormandy (Sony)
● Brahms – Sonatas para Violoncelo – com Rudolf Serkin (DG)
● Beethoven – Sonatas para Violoncelo – com Sviatosláv Richter (EMI)
● Henri Dutilleux e Witold Lutoslawski – Concertos para Violoncelo – duas grandes encomendas contemporâneas (EMI)
● Bach – as Suítes para Violoncelo solo (EMI)
● Shostakóvitch – Sinfonia nº 4 – parte da integral com a Sinfônica de Washington (Teldec).
● Tchaikóvski – Ievguiêni Oniéguin – com Vishniévskaia, Atlántov, Mazurôk (EMI)
● Shostakóvitch – Lady Macbeth de Mtsensk – com Vishniévskaia, Gedda (EMI).
● o álbum da EMI Classics com ciclos de canções – Tchaikóvski, Mússorgski, Rachmáninov, Shostakóvitch – que ele gravou com Vishniévskaia.
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