domingo, 18 de março de 2007

o piano, de cage a milton nascimento - por joão marcos coelho

O piano preparado de John Cage (1912-1992) é uma das provas de que a necessidade é a mãe, se não de todas, pelo menos de algumas das mais instigantes invenções humanas. E o (ou a?) pianOrquestra de Cláudio Dauelsberg é a prova provada de que não há mesmo mais limite algum entre os diversos adjetivos idiotas que seccionaram a música desde meados do século 19, quando a ascensão do mercado provocou a cisão entre música de invenção e música de entretenimento (ou música clássica ou erudita, e música popular). Podem chamar nossa realidade atual do que quiserem – pós-moderna, transmoderna, etc.,etc. O importante é que nem pensamos mais neste tipo de barreiras: a música hoje ou é boa ou é ruim. O piano, preparadíssimo e atualíssimo, é a estrela principal de dois DVDs que estão sendo lançados praticamente ao mesmo tempo. O primeiro, no mercado internacional, intitula-se “John Cage: the works for piano 7”, com Margaret Leng Tan” (existe uma versão em CD, consulte o site www.moderecords.com). O segundo sai aqui no Brasil mesmo, e intitula-se “PianOrquestra – dez mãos e um piano preparado”, com direção artística de Cláudio Dauelsberg, e já está nas lojas.
Um pouco de história
Nos idos de 1940, Cage foi convidado a fazer a música para um balé que excursionaria por algumas cidades americanas. Mas não havia dinheiro para se contratar todos os músicos de percussão (e os instrumentos) e transporta-los de cidade em cidade. “Só há um piano disponível”, disseram-lhe. Engenhosamente, Cage tratou de fazer aflorar no instrumento sua verdadeira vocação: afinal, o piano é essencialmente um instrumento de percussão. Parafusos, borracha, vedacit, plástico, panos, papéis e outros objetos colocados no meio das cordas de um piano normal o transformaram num inédito instrumento. Não se tratava de modificar o piano, mas criar um novo instrumento. Em uma década Cage compôs duas dúzias de peças para o piano preparado, impondo-o como uma das invenções mais instigantes do século 20.Tão instigante que sessenta anos depois um grupo de músicos brasileiros bem informados – e bem formados, pois todos possuem sólida formação musical e conhecem o trabalho de Cage – concebe este(a) pianorquestra, onde cinco artistas múltiplos (pianistas e percussionistas) se atracam com o instrumento devidamente modificado com os mesmos parafusos e borrachas prescritos por Cage seis décadas atrás. Uma havaiana aqui, uma luva ali e correntes de metal acolá demonstram que estamos em 2007.
Duas revoluções
Num e noutro casos, impera a imaginação tecnicamente bem nutrida – a outra ponta que precisa casar-se em pé de igualdade com a necessidade de ocasião. Quando as duas andam juntas, aí sim temos as verdadeiras mães da invenção. Pois de nada adianta querer ser inovador sem estar bem apetrechado do ponto de vista artesanal.O piano preparado – também chamado de “piano bem falsificado” pelos detratores – propiciou a Cage a mais notável de suas primeiras obras, as vinte “Sonatas e Interlúdios” de 1946-48. Embora sejam harmonicamente estáticas, as sonatas construídas formalmente à la Domenico Scarlatti encantam pelos timbres inesperados e fascinantes que arrancam do instrumento e pela variedade percussiva. Antes da partitura convencional propriamente dita, Cage coloca uma página detalhada indicando as preparações. São 45, no total. E atuam sobre altura, duração, intensidade e timbre. Quando sacou que cada execução seria necessariamente diferente, dependendo de cada piano e do modo como se introduzem os objetos, Cage ficou meio chateado. Mas rapidamente passou a gostar desta falta de controle – que seria a chave de toda a sua obra futura, fundada no acaso. O ciclo representa uma virada decisiva: ele constata pela primeira vez que não consegue comunicar suas experiências emocionais através da musica. Começa a questionar a noção de que a música é um meio de o compositor expressar suas emoções. A ênfase transfere-se naquele momento do compositor para o ouvinte – o que, mais tarde o levaria à música do acaso e à completa eliminação da auto-expressão no processo criativo.Naquela década Cage começou a namorar com o misticismo e a filosofia oriental. E aprendeu que a música deve ter um efeito espiritual e ético: seu propósito é “moderar e acalmar a mente, tornando-a suscetível à influência divina”.O DVD de Margaret Leng Tan – que trabalhou diretamente com Cage em sua última década de vida – é exemplar. Além disso, ela mesma explica, passo-a-passo, num ótimo documentário de 33 minutos, como se prepara o piano. E promove uma primeira audição de Cage: as “Chess Pieces” de 1994, recentemente redescobertas, nasceram como um quadro que é um tabuleiro de xadrez (uma de suas obsessões, ao lado dos cogumelos). Em cada um deles, Cage compôs pequenos núcleos de música. São quase 8 minutos que constituem uma revelação, já que a combinação entre eles é obra basicamente da intuição de Tan (é, portanto, apenas uma entre muitas leituras possíveis).
Villa, Tom & Milton
PianOrquestra é o resultado de anos de pesquisa de Cláudio Dauelsberg, Gisele Sant’Ana, Claudia Castelo Branco, Késia Decoté e Jadna Zimmermann. Por meio de 10 mãos e uma preparação específica do piano, faz migrar as técnicas inventadas por Cage para o domínio da música brasileira. Eles surpreendem ao reproduzir com perfeição os timbres de um contrabaixo, de uma guitarra ou um cavaquinho. Isso sem falar na riquíssima percussão exploratória do piano por dentro e por fora. O repertório percorre, em refinados arranjos de Dauelsberg, compositores ditos eruditos como Villa-Lobos (precisa a versão de “Polichinelo” da “Prole do Bebê”) e Cláudio Santoro (ótimas as leituras da fantasia da sonata no. 4 e do Estudo no. 1). Mas centra fogo mais amplo no repertório popular. Não por acaso, “Cravo e Canela” e “Ponta de Areia” de Milton Nascimento, assim como “Samba de uma nota só”, de Tom Jobim, constituem os pontos mais altos de um DVD cuidadosamente produzido, onde o espectador faz uma verdadeira viagem pelo instrumento, guiado alternadamente pelas 10 mãos. Tudo isso em cerca de 50 minutos, curiosamente o mesmo tempo que duram as sonatas e interlúdios de John Cage. O guru do acaso e da indeterminação certamente abriria um de seus típicos largos sorrisos ao ver um desdobramento desses de seu piano preparado.

sexta-feira, 16 de março de 2007

a valquíria de keilberth - por lauro machado coelho

Desde os primeiros compassos, descrevendo a tempestade, tem-se a certeza de que essa será uma interpretação de alta eletricidade. Prevista para ser a primeira versão comercial do Anel do Nibelungo, depois bloqueada pela Decca, para que não prejudicasse o lançamento da integral de sir Georg Solti, a versão ao vivo de Joseph Keilberth, no Festival de 1955, dormitou nos arquivos de Bayreuth durante meio século. Seu lançamento pelo selo Testament está causando furor na Europa e Estados Unidos. E por esta Valquíria, é perfeitamente possível entender por quê.A qualidade da tomada de som é surpreendente, de um relevo excepcional para um registro ao vivo de 53 anos atrás; e os eventuais ruídos de cena são bem menos intrusivos do que, por exemplo, na versão de Pierre Boulez. Não é apenas o fogo que Keilberth investe nas passagens mais dramáticas: ele sabe encontrar, para cada passagem, o tom exato. Com um Todesverkündigung – o encontro dos meio-irmãos antes da batalha – cheio de emoção, contrasta a cena da morte de Siegmund, violenta e desoladora; e a Música do Fogo Mágico, no final da ópera, tem uma incandescência extraordinária.O timbre escuro, abaritonado, do chileno Ramón Vinay faz dele um Siegmund heróico, mas que sabe ser imensamente terno quando declara seu amor a Sieglinde – a holandesa Gré Brouwenstijn, muito feminina e delicada. Vinay ainda está melhor, aqui, do que na versão pirata de 1957, regida por Hans von Knappertsbusch, em que a sua Sieglinde era Birgit Nilsson. Muito persuasivo na narrativa de seus sofrimentos no primeiro ato – em que contracena com o cavernoso Hunding de Josef Greindl – Vinay alça-se a um verdadeiro êxtase amoroso no dueto com a irmã, que desabrocha numa radiosa seqüência do Winsterstürme – Du bist der Lenz.Mas é a dupla Hans Hotter-Astrid Varnay – a mesma que reaparecerá, em 1957, na versão Kna – quem domina a gravação. O Hotter que ouviremos, tempos depois, no registro de Georg Solti, já não terá mais a riqueza de texturas, a perfeita combinação de recursos vocais e precisão na emissão do texto, de que ele dá provas aqui: seja na mistura de frustração e vergonha por ter tido de capitular diante de Fricka (muito bem defendida por Georgine von Milinkovic); seja na fúria ao constatar a desobediência da filha predileta. Um dos momentos mais lancinantes do espetáculo é a dor com que, no final do segundo ato, Wotan se vê obrigado a sacrificar o próprio filho, para manter a promessa feita à sua negligenciada mulher.A interpretação de Hotter é, naturalmente, realçada pela extrema interação que ele sempre teve, no palco, com Astrid Varnay – aqui no auge da forma vocal e, a julgar pelas fotos da montagem, da beleza física. Nessas condições, cada meandro da longa confrontação de pai e filha, no terceiro ato, em que Brünhilde lhe prova ter, na verdade, feito o que o seu coração pedia e, com isso, dobra a sua decisão de castigá-la da pior maneira possível, é simplesmente apaixonante. E a invocação a Loge, para que erga, em torno da filha adormecida, uma muralha de fogo, é de uma extrema ternura.A julgar por esta Valquíria, e pelo entusiasmo com que a crítica estrangeira acolheu o lançamento do Siegfried, tudo indica que este Anel do Nibelungo – que dormitou meio século no fundo da caverna, protegido ferozmente pelo dragão dos interesses comerciais das gravadoras – tem tudo para ocupar um lugar de primeiro plano entre as grandes integrais da Tetralogia.

o adeus de uma geração - por lauro machado coelho

É toda uma geração que se vai. Primeiro Birgit Nilsson, depois Elisabeth Schwarzkopf, o tenor James King e, agora, a soprano sueca Astrid Varnay. Todos eles nomes ligados à escola germânica e, em especial, à restrita classe dos artistas em condições de interpretar as personagens do universo muito específico – em termos vocais e interpretativos – do drama lírico wagneriano. A Brünhilde e a Isolda da Nilsson; a Eva da Schwarzkopf; o Lohengrin e o Siegmund de King foram modelos, nos quais a geração posterior não deixa de se mirar. Nesse campo, Varnay foi uma das intérpretes mais ecléticas: Brünhilde e Sieglinde igualmente impressionantes; Isolda brilhante, no início da carreira, mas também Fricka de muita autoridade, quando a voz tendeu para o grave, e ela passou a fazer grandes papéis de mezzo – como a Clitemnestra, da Elektra, de Richard Strauss, de que deixou eletrizante documentação em vídeo.Eram cantores cuja carreira evoluiu devagar, num ritmo que respeita a o amadurecimento natural da voz – ao contrário dos cantores atuais que, devido à facilidade de locomoção e às pressões do Box Office, correm de um teatro para o outro, e acabam, muitas vezes, enfrentando prematuramente papéis para os quais ainda não estão prontos. Repassar, por exemplo, o programa do Festival de Bayreuth deste ano é dar-se conta de que nomes novos estão surgindo: Nina Stemme, que cantou Isolda, em estúdio, ao lado de Plácido Domingo; Stephen Gould, que fez Siegmund, aqui na Osesp, no primeiro ato da Valquíria, regido por Ira Levin; Petra Lang, uma interessante Cassandra na segunda gravação que sir Colin Davis fez dos Troianos, de Berlioz; ou Adriane Pieczonka que, a boas interpretações de Mozart e Strauss, acrescentou uma Sieglinde bastante delicada.São artistas que, sem dúvida alguma, têm suas qualidades. Mas estão longe de alcançar o patamar de referência de cantores inigualáveis não só pela extensão ou as características muito especiais do material vocal, mas sobretudo por uma intensidade de interpretação que, no caso de Astrid Varnay, por exemplo, ia da feminilidade de Sieglinde às linhas ásperas e autoritárias da Kostelnicka, na Jenufa, de Janácek (de que ficou a preciosa documentação, em vídeo, de um espetáculo regido, em Munique, por Rafael Kubelík).Por outro lado, a atual situação do canto wagneriano não deixa de nos reservar surpresas agradáveis – e assim é o caso da montagem de fevereiro de 2005, do Tristão e Isolda, no Grand Théâtre de Genebra, que está circulando em DVD pelo selo Bel Air Classiques. A primeira boa surpresa é a regência de Armin Jordan que, à frente do Orchestre de la Suisse Romande, mostra-se um digno membro do seleto grupo de respeitáveis intérpretes wagnerianos (sua única incursão anterior nesse universo tinha sido, em 1981, a trilha para a filmagem do Parsifal feita por Syberberg). Sua leitura é expansiva e cheia de vibração, especialmente no terceiro ato, em que o delírio de Tristão agonizante ganha um relevo todo especial.O timbre mais escuro de Jeanne-Michèle Charbonnet, seus graves redondos oferecem estimulante alternativa à escola germânica, de Isoldas estentóreas e de colorido metálico (Nilsson, Behrens, por exemplo). Bonita, expressiva em cena – ruiva como toda irlandesa deve ser – talvez Charbonnet sofra um pouco com a tessitura implacável do início do dueto de amor – no qual a Birgit Nilsson da versão Böhm é incomparável. Mas faz uma leitura muito envolvente das passagens líricas: o O sink hernieder, Nacht der Liebe, do segundo ato, e principalmente Mild und leise, o monólogo final, de que ela oferece interpretação muito comovente.Ao lado dela, o desconhecido Clifton Forbis também é uma boa surpresa. O timbre abaritonado lembra o de um intérprete como o Suthaus da gravação Furtwängler. É um Heldentenor imponente, e um ator que sugere de forma convincente a evolução psicológica da personagem, do constrangimento inicial, diante do amor reprimido, à explosão da paixão incontida e, depois, ao desvario produzido pela febre e o temor de que Isolda não responda a seu apelo amoroso. Charbonnet e ele compõem com muita precisão o par centra.Se na gravação Pappano, com Domingo, a japonesa Mihoko Fujimura não impressionava especialmente, no palco a sua Brangäne obtém um rendimento bem melhor, pois ela é uma boa atriz. Albert Dohmen, o bom Kurwenal, é conhecido de nosso público: ele esteve em São Paulo, em 1995, fazendo Wolfram na montagem do Tannhäuser. Vocalmente, Alfred Reiter está longe de ter o carisma de um René Pape ou de um Kurt Moll; mas seu rei Marke, mais velho e de aspecto frágil, é dramaticamente verossímil, de uma forma como esses outros cantores não chegam a ser.Sobretudo, numa época em que as montagens internacionais nos expõem a soluções discutíveis e, com freqüência, de mau gosto, o espetáculo de Genebra agrada pela concepção moderna, mas funcional, de Olivier Py, apoiada em bons cenários e figurinos – de estilo intemporal – desenhados por Pierre-André Weitz: uma estrutura de metal e néon que sugere o navio; e o quarto de Isolda, no segundo ato. Mas, principalmente, muito curiosa é a idéia de colocar o leito de Tristão no centro de uma piscina (uma alusão à ilha de Kareol), da qual emergem as figuras que povoam seus pesadelos, dando ao terceiro ato uma ambientação onírica particularmente eficaz.

janet, lucy, lucia - por sérgio casoy

Janet Dalrymple devia ter pouco mais de vinte anos quando morreu em 1669. Ela pertencia a uma família importante. Seu pai James, o primeiro Visconde de Stair, foi um dos jurisconsultos mais respeitados da história da Escócia, eminente professor de leis na Universidade de Glasgow. Suas já extensas propriedades cresceram ainda mais quando ele se casou com Margaret Ross, herdeira de Balneil em Wigtonshire. A geniosa Lady Margaret viveu até idade avançada, e granjeou fama como defensora inflexível da prosperidade e prestígio da casa Dalrymple, a qual, nos duzentos anos seguintes, haveria de dotar a nação escocesa de uma série notável de militares, literatos, políticos e advogados. Como não se conhece nenhum retrato de Janet, eu, pessoalmente, costumo imaginá-la como uma típica beleza escocesa daqueles anos, frágil e delicada, de tez muito branca e uma longa cascata de cabelos loiros – quem sabe ruivos – caindo pelos ombros, a emoldurar um rosto de faces rosadas e grandes olhos claros sempre assustados. Sem que a família dela soubesse, Janet e o jovem Lord Rutherford, membro da nobreza menor e praticamente sem dinheiro, se apaixonaram perdidamente e juraram pertencer um ao outro. Juntos, quebraram uma moeda de ouro, o que equivalia a um compromisso solene. Janet – segundo se disse depois – invocara sobre sua cabeça todos os demônios do inferno caso viesse a romper o noivado. Mas Mamãe Margaret, que acreditava piamente ser a submissão universal à sua vontade um seu direito divino, tinha planos muito diferentes, e combinou o casamento da filha com Lord David, filho e herdeiro dos ricos Dunbar de Baldoon, que além de sangue azul nas veias possuíam vastas propriedades na mesma Wigtonshire onde Lady Margaret já possuía grandes extensões de terra recebidas por herança. Nada mau, para os dois lados, aumentar o latifúndio através do casamento. Tão ocupadas estiveram as duas famílias em acertar os detalhes do contrato que se esqueceram de avisar a noiva, a qual, quando finalmente soube, se recusou, alegando já estar comprometida com Rutherford. A mãe, furiosa, inventou uma desculpa esfarrapada segundo a qual qualquer noivado que não tivesse sido aprovado pelos pais não tinha valor, e descartou Rutherford sem a menor cerimônia através de uma carta seca. Ele respondeu indignado: conhecia seu direito, e só aceitaria a quebra de compromisso se a ouvisse dos próprios lábios de Janet. Lady Margaret foi obrigada a concordar com a visita de Rutherford a Janet, mas com a condição de que ela também estivesse presente ao encontro. Janet, apavorada, recitou tudo que sua mãe lhe havia ensinado e dispensou o namorado. O jovem lorde perdeu as estribeiras. Atirou com raiva sua meia-moeda aos pés da ex-noiva, xingou a mãe, amaldiçoou a filha e toda a família e saiu batendo a porta com força para nunca mais voltar. E Janet, completamente apática, muda, foi conduzida ao altar como um autômato, sem vontade própria, com o olhar perdido na distância. A cerimônia aconteceu em 24 de agosto de 1669, seguida por uma grande festa. Quando as danças começaram, o novo casal, como de praxe, retirou-se para a câmara nupcial para consumar o casamento. Não demorou muito tempo para que um grito pavoroso, um uivo de gelar o sangue atravessasse as paredes do castelo e chegasse até o salão de baile. Percebendo que o grito provinha do quarto do casal, os parentes mais próximos apressaram-se a arrombar a porta, e se depararam com uma cena estarrecedora. Caído próximo ao limiar da porta, David Dunbar agonizava numa poça de seu próprio sangue. Tinha sido apunhalado pela noiva. A pobre Janet, que nada vestia a não ser uma camisola de tecido fino empapada de sangue, estava encolhida num canto próximo à chaminé da lareira, com um estranho sorriso fixo no rosto, a murmurar frases sem nexo. A infeliz criatura não havia suportado tanta pressão. Enlouquecera completamente. Janet Dalrymple jamais recuperou a razão e morreu poucos dias depois, em 12 de setembro. Lord David, ao contrário do que se esperava, sobreviveu aos ferimentos. Por via das dúvidas, nunca mais se casou, e o fim de sua vida foi, no mínimo, prosaico. Doze anos depois, David Dunbar, literalmente, caiu do cavalo. Durante uma viagem, sofreu uma queda de sua montaria e quebrou o pescoço. Cento e cinqüenta anos após os tristes eventos que levaram à morte de Janet, Sir Walter Scott, sempre à cata de argumentos para escrever mais uma daquelas novelas de fundo histórico ambientadas em sua Escócia natal que o fizeram rico e famoso, deparou-se com a crônica daquela tragédia e resolveu transformá-la num romance. Como os Dalrymple, na primeira metade do século XIX eram ainda muito influentes e atuantes em vários setores do governo, Scott, extremamente cauteloso, resolveu evitar qualquer possibilidade de um processo legal. Assim, trasladou sua narrativa do sudoeste da Escócia, perto da fronteira da Inglaterra, onde os fatos realmente aconteceram, para o extremo oposto do país, o sudeste, nas montanhas de Lammermoor, e batizou seu livro como The Bride of Lammermoor (A Noiva de Lammermoor). Alterou também a cronologia da história, trazendo-a alguns anos para a frente, para o período imediatamente anterior à unificação entre Inglaterra e Escócia, durante o reinado de Guilherme III de Orange e sua esposa Maria II da Inglaterra, ambos protestantes, embora ela fosse filha do rei católico Jaime II Stuart. E como uma mera tentativa de aumentar o patrimônio, embora real, não parecesse ao autor da novela motivo suficiente para justificar uma tragédia de amor e sangue destas proporções, Scott, de olho no público, resolveu recontar, desta vez em trajes escoceses, a história de Romeo e Julieta. Janet transformou-se em Lucy Ashton, filha de Sir William e de Lady Ashton, enquanto Rutherford tornou-se Edgar Ravenswood, cuja família, por motivos políticos e religiosos, é inimiga mortal dos Ashton, que inclusive ocupam, no momento da narrativa, o castelo que um dia pertenceu aos ancestrais de Edgar. Como todos já sabem, Lucy e Edgar se apaixonam. Os Ashton, porém, em busca de proteção política em difíceis tempos de mudanças, forçam o casamento de Lucy com Lord Arthur Bucklaw, um inimigo político e pessoal de Edgar. Após o casamento, Edgar desafia o novo marido e o irmão da noiva para um duelo no dia seguinte. Tal duelo, entretanto, jamais se realizará: durante a noite de núpcias, Lucy apunhala o marido, mas os médicos conseguem salvá-lo. Logo a seguir, a jovem morre enlouquecida. Edgar sem saber de nada, ao cavalgar de madrugada para o local do duelo, é tragado por uma poça de areia movediça e desaparece para sempre, cumprindo uma antiga – e sinistra – profecia. Com seus fantasmas, mistérios e torres em ruínas, The Bride of Lammermoor é um típico exemplo de romance gótico, gênero de novela que floresceu entre o final do século XVIII e o início do XIX entre os europeus de língua inglesa, cujo grande representante é o Frankenstein (1818) de Mary Shelley. No ano de 1819, quando a novela de Scott foi publicada, o romantismo firmava suas raízes no âmbito da ópera italiana. Pouco a pouco, os teatros líricos da península foram se despedindo do classicismo, cujos argumentos tinham por praxe fazer com que a razão triunfasse sobre as emoções, encerrando a ópera com uma lição de moral e um final feliz sempre que possível, e passaram a abraçar cada vez com mais força a explosão romântica. De repente, fazer um personagem jogar a vida por uma paixão e morrer ou matar por amor e ciúme, encerrando o espetáculo de forma trágica e sangrenta – embora, no princípio, cuidando para que as mortes ocorressem atrás do palco afim de não chocar o público –, passa a estar na ordem do dia. Vai-se abandonando o mundo greco-romano que foi moldura das óperas barrocas e clássicas, e se desenha uma tendência a escolher argumentos de fundo histórico ambientados na Europa num período compreendido, na grande maioria das vezes, entre a Idade Média e o final do século XVII. Sobre este pano de fundo, os protagonistas se debatem ao sabor do vendaval de emoções descontroladas, amando, odiando, enlouquecendo e lutando. Dentro desta linha, consolida-se, de forma lenta e firme, uma preferência do público e dos operistas italianos pelos romances ambientados na Inglaterra e na Escócia, que são, nos libretos, tratados com muito pouco rigor histórico e geográfico, fazendo daqueles países, muitas vezes, exóticas e misteriosas regiões. Há exemplos dessa ambientação já nas óperas dos proto-românticos Giovanni Simone Mayr (Ginevra di Scozia, 1801; La Rosa Bianca e La Rosa Rossa, 1813) e Gioachino Rossini (Elisabetta Regina d’Inghilterra, 1815; La Donna del Lago, 1819), e também nas óperas dos primeiros românticos italianos como Michele Carafa (Elisabetta di Derbyshire, 1818) e Carlo Coccia (Maria Stuart, Regina di Scozia, 1827). Os dois expoentes da geração de compositores seguintes tampouco deixaram de musicar libretos passados na Escócia ou Inglaterra. Vincenzo Bellini estreou La Straniera em 1829 e I Puritani em 1835, enquanto o fértil Gaetano Donizetti compôs, entre outras, Alfredo il Grande (1823), Emilia di Liverpool (1824), Il Castello di Kenilworth (1829), Anna Bolena (1830), Rosmonda d’Inghilterra (1834) e Maria Stuarda (1835). As obras de Sir Walter Scott eram muito conhecidas e estavam na moda na Itália da primeira metade do século XIX. Elas continham exatamente as intrigas e os contrastes de que os operistas do romantismo necessitavam. Serviram de base para uma infinidade de óperas compostas1 em vários paises europeus. Não é de se espantar, portanto, que Donizetti escolhesse La Fidanzata2 di Lammermoor, a tradução italiana do livro de Scott, como tema para a nova ópera que ele tinha de estrear em julho de 1835 em cumprimento de um contrato assinado com o Teatro San Carlo de Nápoles. Era um assunto perfeito. A violência das paixões geradas por um amor impedido de realizar-se pelo antagonismo de duas famílias inimigas estimulava a fantasia criativa do autor, como ele próprio sempre afirmou3. Além disso, a narrativa não apresentava quaisquer problemas de lesa-majestade ou de agressão à igreja que pudessem despertar o olhar desconfiado da censura. Contava ainda o fato de que o argumento era conhecido, já havia servido, apenas na Itália, para três óperas anteriores, Le Nozze di Lammermoor de Carafa (1829), e duas La Fidanzata di Lammermoor, respectivamente criadas por Luigi Rieschi em 1831 e por Alberto Mazzucatto em 1834, e, portanto, bastante presentes na memória do público de ópera. Aquilo que pode parecer ao espectador de hoje algo monótono, a repetição do argumento, para os italianos da primeira metade do século XIX funcionava justo ao contrário. O interesse maior do público focava-se no canto, nas possibilidades que a partitura criava para que os intérpretes pudessem exibir suas habilidades canoras e extasiar os freqüentadores do teatro. Por isso, tanto melhor quanto mais conhecido o argumento, já que assim, ninguém teria de perder tempo em entender uma nova história e podia ficar atento ao desempenho dos tenores e sopranos. Reutilizar argumentos era uma prática antiga e corriqueira. Basta lembrar que antes da versão definitiva de Rossini, O Barbeiro de Sevilha teve nada menos de dez versões, e o maior libretista do classicismo, Pietro Metastasio, escreveu só 27 libretos, cada um dos quais utilizado muitas vezes. Alguns deles chegaram a servir de base para sessenta ou setenta óperas, sempre com o mesmo título. Donizetti teve a felicidade de ter como libretista o napolitano Salvatore Cammarano, que além de poeta inspirado e experimentado, exercia no Teatro San Carlo – onde Donizetti era diretor artístico – uma função equivalente à do atual diretor de cena. Tinha grande experiência de palco, sabia o que funcionava e o que não funcionava, e compreendia como poucos a essência do melodrama romântico italiano, do qual seu poema Lucia di Lammermoor é um dos mais perfeitos ícones. Versos como Regnava nel silenzio/Alta la notte e bruna; Verrano a te sull’aure/I miei sospiri ardenti/Udrai nel mar che mormora/l’eco de’miei lamenti e Tu che a Dio spiegasti l’ali/O bell’alma innamorata4, túrgidos do melhor espírito do romantismo, ao associar o íntimo dos personagens às forças da natureza como se essa fosse uma caixa de ressonância do estado de espírito dos protagonistas naquele determinado momento, tiveram o condão de induzir Donizetti a conceber melodias inesquecíveis para musicá-los. Estes e outros trechos memoráveis desta ópera, nascidos do casamento perfeito entre os versos do libretista napolitano e a música do fecundo bergamasco, hoje fazem parte da memória coletiva dos amantes de ópera. São aquelas passagens sempre presentes que todos levamos no cérebro e no coração. O lado prático de Cammarano não era menos brilhante. Num prodígio de compressão, o poeta-encenador eliminou vários personagens principais ao transformar o livro de Scott em ópera, barateando imediatamente a produção e permitindo que a ópera continue sendo montada ainda hoje. Cammarano fundiu o pai de Lucy e seus dois irmãos em apenas um irmão mais velho, Enrico, forma italianizada do Henry Ashton original. Além disso, o libretista teve visão suficiente para matar e enterrar Lady Ashton pouco antes da ópera começar, fato que, além de eliminar mais uma personagem, permitiu que se desenvolvesse um corolário importante, situando na morte da mãe a origem do crescente estado maníaco-depressivo da heroína que terminará por levá-la à total insanidade. Como de costume nas óperas italianas, os outros personagens também tiveram seus prenomes “nacionalizados”. Arthur Bucklaw virou Arturo, o que aparentemente lhe trouxe azar, pois ao contrário da história real e do livro de Scott, ele morre apunhalado na noite de núpcias. Edgar tornou-se Edgardo di Ravenswood, e sua amada, que nascera Janet e já fora chamada de Lucy Ashton, transformou-se finalmente em Lucia di Lammermoor, nome através do qual atingiu a imortalidade. No início daquele mesmo ano, Donizetti fora a Paris a convite do sumo Rossini, então diretor do Théâtre-Italien. Rossini havia comissionado tanto a Donizetti quanto a Bellini uma nova ópera para aquela temporada. Donizetti compôs o drama veneziano Marin Faliero, que embora de qualidade e relativamente bem-recebido, teve seu sucesso completamente eclipsado pela estréia retumbante da derradeira ópera de Bellini, I Puritani. Foi a sensação da temporada, com a famosa cena de loucura de Elvira, a principal personagem feminina, que Bellini calcou, segundo ele próprio, na protagonista de Nina ossia La pazza per Amore (1789), de Giovanni Paisiello. Tanto Nina quanto Elvira enlouquecem quando o namorado as abandona, mas recuperam a razão com a volta deles, e as óperas terminam com final feliz. É preciso entender que a loucura, dentro dos padrões da ópera romântica, não era tratada exatamente como uma doença, mas sim como uma espécie de fuga, uma viagem a um local mental onde os espíritos sensíveis e frágeis, principalmente os femininos, submetidos à pressão irresistível dos acontecimentos externos, buscavam um refúgio que lhes permitisse repousar e proteger-se. A loucura era como uma casca, um escudo protetor. É por isso que, quando a causa responsável pela loucura era removida – como nos dois exemplos acima – a personagem voltava ao normal. Mas quando, como no caso da Lucia di Lammermoor, o motivo da loucura não pode ser eliminado – o casamento com Arturo é irreversível – o desfecho se encaminha fatalmente para uma tragédia, para un fatto di sangue. Quanto ao aspecto vocal, numa nítida herança do virtuosismo barroco, os desvarios de uma mente que divaga são sempre magnificamente associados – com o tempo, tornou-se uma exigência do público – ao chamado canto fiorito, à coloratura, com todo o seu pirotécnico desfile de volatas, gorjeios, portamentos e vocalises arrematados por notas sobreagudas que fazem a delícia de quem vai ao teatro. Donizetti estava presente à estréia de I Puritani, foi testemunha ocular do sucesso que a cena de Elvira obteve. Embora não exista nenhum documento escrito que o comprove, não me parece ser mera coincidência a semelhança entre a maneira como as cenas de loucura de I Puritani e de Lucia di Lammermoor se desenrolam. É exatamente o mesmo esquema: o baixo canta sua única ária importante, na qual descreve o estado mental em que a jovem heroína se encontra, preparando o público para a entrada da grande – e longa – scena do soprano, que surge logo a seguir, desvairando-se em intrincadas coloraturas sob a vista estarrecida dos outros personagens e do coro. É muito claro para mim que Donizetti, arguto observador, incorporou o que havia de melhor no trabalho de Bellini, adaptando-o – com muito sucesso, diga-se de passagem – à sua Lucia. Deve ter sido ele a pedir a Cammarano para criar uma cena nestes termos. Afinal, durante os 38 dias que levaram para compor Lucia, os dois trabalharam quase sempre na mesma sala, lado a lado, embora durante muitas horas, os únicos ruídos que se ouviam eram o de suas penas e o farfalhar das páginas que o libretista, metódico e contínuo, ia passando para o velocíssimo compositor. Apesar de cumprido o prazo previsto, a burocracia interna do Teatro San Carlo acabou mudando a estréia de julho para 26 de setembro de 1835. A recepção – um dos maiores sucessos da carreira de Donizetti – pode ser avaliada por um trecho da carta que o autor escreveu a seu editor três dias depois da estréia: “Permita, amigávelmente, que eu me envergonhe e te conte a verdade. [A ópera] agradou, agradou muito, se me é lícito acreditar nos aplausos e nos cumprimentos recebidos. Fui chamado ao palco muitas vezes, e o irmão de Sua Majestade Leopoldo, que assistiu e aplaudiu, me fez os mais lisonjeiros elogios. Na segunda noite, aconteceu algo inabitualíssimo em Nápoles: no final [do segundo ato], depois de grandes gritos de ‘viva’ ao adágio, Duprez, na maldição, obteve enormes aplausos antes da stretta.[...] A Tacchinardi [Lucia], Duprez [Edgardo], Cosselli [Enrico] e Porto [Raimondo] portaram-se muitíssimo bem, e especialmente os dois primeiros, que foram portentosos”. Até a primeira metade do século XX, costumava-se escolher para o papel de Lucia um soprano de coloratura, que entendemos como um soprano do tipo leggero com natural facilidade para o canto ornamental. Era a concepção original de Donizetti, que escreveu o papel sob medida para Fanny Tacchinardi-Persiani. Grandes Lucias foram, nessa linha, Adelina Patti, Luisa Tetrazzini, Amelita Galli-Curci, Toti dal Monte, Lily Pons e Anna Moffo, entre tantas outras. Mas o surgimento do fenômeno Maria Callas, na década de 1950, deixou muito claro que o papel não é domínio exclusivo dos sopranos de coloratura; pode ser atribuído também a sopranos com coloratura, embora de voz mais escura, mais dramática, que os italianos classificam como drammatico d’agilità. Basta lembrar que o soprano Giuseppina Strepponi, futura senhora Giuseppe Verdi, arrancou aplausos do público do Teatro Alla Scala cantando a parte de Lucia muito pouco tempo antes de estrear como a extremamente dramática Abigaile no Nabucco. Embora o soprano ocupe o papel mais importante da ópera, Lucia é sempre uma grande oportunidade para que o tenor exiba seus dotes. O papel de Edgardo tornou famosos muitos tenores do passado. Ainda no século XIX, Napoleone Moriani foi cognominado de il tenore della bella morte, porque morria de forma bonita, emocionante no final da Lucia. Como tinha nascido em Florença, foi chamado também de il cigno dell’Arno, o cisne do Rio Arno. O cisne como se sabe, canta antes de morrer. Pouco mais novo do que ele, Gaetano Fraschini viu sua fama disparar quando, em certa récita de Lucia, num procedimento que nunca mais abandonou, caprichou no lá agudo fortíssimo que a partitura indica para o tenor na cena em que Edgardo amaldiçoa Lucia e sua família. A imprensa descreveu essa nota como “o som de um prato de prata percutido por um martelo também de prata”. Foi o quanto bastou para que o público apelidá-lo de il tenore della maledizione, o tenor da maldição. A identificação entre Fraschini e a praga rogada por Edgardo tornou-se tão completa que, alguns anos depois, quando Verdi escolheu Fraschini como primeiro intérprete de seu Stiffelio, não hesitou em incluir uma maldição com a mesmíssima nota lá, fortíssima, para que o tenor pudesse brilhar. Após os primeiros cinqüenta anos de Lucia, o público, embora não totalmente, perdeu o entusiasmo inicial pela obra-prima de Donizetti, fascinado pelo wagnerismo, pelo verismo e por outros “ismos”. A ópera foi, no início do século XX, fortemente mutilada. Muitos teatros chegaram ao exagero de adotar como prática comum fazer cair o pano e mandar o público para casa após a cena de loucura. A grande cena final de Edgardo, aquela em que ele se apunhala ao saber da morte de Lucia, só foi restaurada depois que o tenor Enrico Caruso, com toda sua autoridade, se recusou expressamente a pisar o palco do Metropolitan de Nova York para participar de uma Lucia aleijada. Caruso, viga-mestra do teatro, foi prontamente atendido. Sorte de quem teve a oportunidade de ouvi-lo cantar Tombe degli avi miei e Tu che a Dio, trechos que ele nunca gravou. Embora a maioria das óperas de Donizetti tivessem sido postas para hibernar no começo do século XX, Lucia di Lammermoor, ao lado de L’Elisir D’amore e de Don Pasquale, jamais desapareceu do repertório, e hoje é interpretada com freqüência. Gosto de pensar que às vezes, suas melodias sublimes se dirigem dos teatros para alguma região desconhecida do cosmos, levando um pouco de conforto e consolo à alma da suave Janet Dalrymple, que morreu de amor.